Arrecadação e despesa federal no RS Estado

Por Darcy Francisco Carvalho dos Santos
e Júlio Francisco Gregory Brunet
Economistas.

Como é sabido, o Estado do RS sofreu recentemente enorme tragédia climática, com prejuízos bilionários tanto nas atividades econômicas, como na arrecadação do setor público. A recuperação dos estragos causados por ela levará anos e, talvez, mais de década. Em função disso, o Estado precisa de ajuda, sendo a principal a do Governo Federal, tanto creditícia, como em benefícios, propriamente. Essa necessidade é independente das constatações do texto a seguir elaborado, feito com base na verdade dos números e também na convicção de que para se reivindicar uma ajuda ou direito não precisa se basear em inverdades, que soem ocorrer nessas ocasiões.

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A iniciativa do presente texto decorre de uma gritante desinformação sobre o quanto entra e o quanto sai do Estado do Rio Grande do Sul do orçamento federal em termos financeiros. Isto é, o quanto a União arrecada e o quanto ela despende nesta unidade da federação.

Tomamos 2020, como referência, porque é o último ano em que está disponível na Internet a arrecadação federal por Unidade da Federação. A arrecadação e dispêndio não mudam de modo significativo em períodos curtos, apesar da atipicidade do ano de 2020, ano da pandemia.

Com base em informações do site Tesouro Transparente – Estados e Municípios; da Receita Federal – Arrecadação por Estado 2020; e, dados do INSS para 2022, construímos uma demonstração sintética dos valores arrecadados e despendidos pela União no RS, em 2020, conforme a Tabela 1 a seguir:

Vemos, então, que entre o que é arrecadado no Estado e a ele devolvido, existe uma diferença em favor do Estado de 5,45% do total arrecadado ou, 0,66% do PIB[1] estadual.

Também é importante lembrar que no Estado do RS existem várias universidades federais, enquanto outros estados como São Paulo, Paraná e Santa Catarina, por exemplo, possuem muitas universidades estaduais. O RS possui somente uma universidade.

 Adite-se também que o Estado do RS possui vários hospitais federais, três deles resultantes da encampação do Grupo Conceição feita pelo Estado em décadas passadas.

 Além disso, em sua fronteira o RS conta com inúmeros quarteis, o que ajuda na manutenção da renda interna do Estado. Talvez sejamos prejudicados em investimentos, como as estradas em que perdemos proporcionalmente para outros estados. Porém no gasto corrente, isto é, a despesa que não é investimento, recebemos uma quantia significativa de recursos além das transferências obrigatórias: em 2020, estas despesas montam ao redor de R$ 10,9 bilhões.

Porém, a despeito do saldo positivo para o Estado do RS entre receitas de despesas da União há um fator em que somos muito prejudicados: Fundo de Participação do Estados – FPE; neste fundo ocupamos a última posição entre todos os Estados. Este assunto é tratado no final deste texto.

Composição da arrecadação federal no Estado do RS

A Tabela 2 mostra que o total arrecadado no Estado foi 4,9% do total brasileiro. A receita base dos fundos: Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e Fundo de Participação do Estados (FPE) totalizou 4,7%. No FPM, o retorno foi 1,66% do PIB estadual; já no FPE o Estado do RS recebeu 0,44% do PIB estadual.

Já no tocante à Previdência, o valor dos benefícios de 2022, a preços de 2020, foi R$ 50.124,1 milhões, tendo sido arrecadado no Estado para a Seguridade Social (Previdência, Assistência Social e Saúde) R$ 44.606,5 milhões. Da contribuição previdenciária, o total arrecadado foi R$ 25.238,5 milhões. Esta contribuição é a que se pode dizer que é para a Previdência. Quando se calcula o resultado da Previdência, tomamos ela como referência; já quando calculamos o resultado da Seguridade Social, tomamos todas (Previdência, Assistência Social e Saúde). Alguém poderá questionar a inclusão dos benefícios previdenciários nos recursos vindos ao Estado. Mas precisa serem incluídos, porque dentro do que é arrecadado pela União no Estado estão incluídas as contribuições para a Seguridade Social.

O INSS

O INSS é um órgão gigante. É a maior despesa nacional.  Em 2023 arrecadou R$ 592,7 bilhões e despendeu com benefícios R$ 898,9 bilhões, apurando um déficit de R$ 306,2 bilhões. Na Seguridade Social que inclui Previdência, Assistência Social e Saúde, o dispêndio foi de $ 1,6 trilhão e o déficit foi de R$ 428,8 bilhões no mesmo ano. A despesa com benefícios do INSS, além de alta, é crescente, passando de 3,36% do PIB em 1991 para 8,1% em 2023, num crescimento anual de 2,8% superior à variação do PIB.

O valor despendido com benefícios no RS em 2022 foi R$ 54,7 bilhões, 8% superior à receita corrente líquida do Orçamento Estadual no mesmo ano, que foi de R$ 50,6 bilhões, para usarmos como exemplo para comparação da magnitude do que está sendo analisado.

A importância do INSS nos estados e municípios e, de modo especial, no Estado do RS, está demonstrada na Tabela 3, onde em três municípios, 60% da população (ou mais) dependem do INSS; em 10 municípios na faixa de 50% a 60% da população depende do INSS; em 49 municípios, na faixa de 40% a 50% da população, dependem do INSS; e, em 154 entre 30% a 40% da população depende do INSS.  No total, 216 municípios, ou 43,5%, mais de 40% são beneficiários do INSS.

Em 2022, o total de benefícios pagos foi de R$ 57,6 bilhões, numa média mensal de RS 4,8 bilhões, correspondendo por dependente a R$ 1.694,13, sendo R$ 1.744,71 para os previdenciários e R$ 1.097,89 para os assistenciais (Tabela 4).

Nesse total 83% é para beneficiários urbano e 17% para beneficiários rurais. A título de curiosidade, mesmo com uma quantidade muito menor, os beneficiários rurais implicam num dispêndio de R$ 177 bilhões, ou 37% superior aos urbanos, cujo total foi de R$ 129 bilhões. É que nos primeiros – rurais -, a contribuição dos beneficiários é de apenas 7% do valor dos benefícios, enquanto nos urbanos é de 90%.

Fundo de Participação dos Estados – FPE

A repartição inicial do FPE tem origem na LC n° 62/1989, quando os Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste ficaram com 85% dos recursos. As regiões Sul e Sudeste ficaram com apenas 15%. Essa distribuição deveria ser alterada em 1992, o que não ocorreu. Em função disso, quatro estados, entre eles o RS, ingressaram na justiça pleiteando uma alteração, no que foram atendidos pelo STF, que determinou a manutenção dos índices vigentes, até 31 de dezembro de 2012, tempo necessário para que o Congresso Nacional aprovasse uma nova legislação, o que foi feito. Para o Estado do RS a emenda foi pior que o soneto, pois detinha um índice de 2,3548, descendo para 1,5193, com a LC 143/2012, perdendo 35%. E o pior veio depois, porque os índices posteriores deveriam levar em consideração o crescimento demográfico e o inverso da renda domiciliar per-capita. Com tais critérios que não favorecem, o Estado do RS culminou em 1,05 em 2023, com leve acréscimo em 2024, para 1,26. A perda anual deverá variar entre R$ 2 e 3 bilhões, já líquidos do Fundeb, conforme o índice do ano e a arrecadação dos impostos que dão origem ao Fundo, o Imposto de Renda e o IPI. (Este assunto é tratado com detalhes no livro Crenças e situações que atrasam o País, Capítulo 2, item 2.2).

Este é sim um caso onde o Estado do RS é grande perdedor, o maior entre todas as unidades da Federação, mas não teve origem no Poder Central propriamente, mas na uma união das três regiões citadas, que mantém a maioria dos representantes nas casas legislativas federais.

Para onde vão os recursos federais no RS

A maior parte dos recursos aplicados diretamente pela Uniao no RS se distribuem em três grandes funções a saber: a) na Função Educação com 45,46% dos recursos; b) na Função Previdência e Assistência Social para o pagamento de aposentadorias dos servidores públicos federais para onde são alocados 21,09% dos recursos; e, c) na Função Saúde, onde são empregados 16% dos dispêndios federais.

De modo concreto na Função Educação são os recursos destinados à sete universidades federais e três institutos federais de educação:  Universidade Federal Do Rio Grande Do Sul, Universidade Federal De Santa Maria, Fundação Universidade Federal Do Pampa, Universidade Federal Do Rio Grande, Fundação Universidade Federal De Pelotas, Fun.univ.fed.de Ciências Da Saúde De Porto Alegre e Universidade Federal Da Fronteira Sul.

Os Institutos Federais são: Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia do RS, Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia de Farroupilha e Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia Sul Riograndense.

Interessante observar que dentro da Função Educação estão os Hospitais Escolas: Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Hospital Das Clínicas Da Universidade Federal de Pelotas, Hospital Universitário Miguel Riet Junior da Universidade Federal de Rio Grande e Hospital Universitário Da Universidade Federal de Santa Maria. Embora na classificação funcional aceita internacionalmente devessem estar na Função Saúde.  

Na função Saúde temos ainda o Grupo Hospitalar Conceição o qual foram destinados em 2020 R$ 1,5 bilhão. Na função Previdência o somatório das despesas alcança R$ 2,3 bilhões onde o grupo principal são servidores aposentados da Educação e Judiciário.

A Tabela 6 abaixo expõe a distribuição por funções:

De resto, como vimos, o RS de fato mais recebe que transfere à Uniao embora a narrativa popular seja de que o Estado seria um grande doador de recursos. O que é fruto de um profundo desconhecimento das contas públicas nacionais.

Referências:

Balanço do Estado do RS, 2020, p.60 – Fundeb

Consolidado Nacional – Estados e Municípios:

https://www.tesourotransparente.gov.br/temas/estados-e-municipios/transferencias-a-estados-e-municipios

INSS – Benefícios por espécie e Benefícios por clientela:

https://www.gov.br/previdencia/pt-br/assuntos/previdencia-social/emitidos-municipios-2021

Receita Federal – Arrecadação por Estado, 2020.

SANTOS, Darcy Francisco dos. Crença e situações que atrasam o País. AGE. Porto Alegre, 2024.

Leis Complementares n° 62, de 28/12/1989  e n° 143, de 17/07/2013.

 Câmara Federal: https://www2.camara.leg.br/ig-orcamento Execução do Orçamento da União


[1] PIB estadual de 2022, R$ 594,6 bilhões.

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