Como é paga a dívida federal (síntese)

A dívida pública federal não é paga, basicamente. Na sua maioria,  é rolada  mediante novas operações de crédito ou operações de refinanciamento. Tomemos o período 2015- 2019, quando as operações de crédito e as operações de refinanciamento corresponderam, em média, a R$ 1.099,3 bilhões.

Descontando-se  os investimentos na ordem de R$ 86,9 bilhões restam para aplicação no pagamento da dívida pública R$ 1.012,4 bilhões. Se parte dos investimentos foi pago com recursos próprios, então na dívida foi aplicado mais, porque recursos de operações de crédito, pela regra de ouro constitucional, só podem ser aplicados em investimentos, inversões financeiras e amortização da dívida.

Então, podemos dizer que  sendo a despesa com a dívida na ordem de R$ 1.106,0 bilhões, R$ 1.012,4 bilhões, ou 91,5%,  foi paga com recursos de terceiros (operações  de crédito e rolagens), ou 8,5%,   para recursos próprios.

E, como no período 2015-2019  houve déficit  primário, os recursos próprios realizados têm origem basicamente nos resultados do Banco Central,  nos rendimentos das disponibilidades do Tesouro Nacional na conta única e no pagamento pelos estados e municípios das prestações dos financiamento das dívidas feitos no final da década de 1990, que agora estão suspensos até o final de 2021 (alguns estados, entre eles o RS, já não pagavam por medida liminar).

A Lei 11.808/2008 estabeleceu que os resultados positivos do Bacen decorrentes das desvalorizações cambiais do real, mesmo quando não realizadas (são apenas uma variação patrimonial) sejam transferidas ao Tesouro Nacional em dinheiro. Isso era destinado ao pagamento da dívida, especialmente a decorrentes dos títulos em carteira no Bacen. Mas houve casos desses recursos serem usados para pagar dívida de mercado e expandir as despesas primárias (2008 e 2014), como foi o caso das pedadas fiscais em 2015.

O Tesouro tinha essa grande fonte de recursos que era um financiamento implícito do Bacen, o que é vedado pela constituição. Esses recursos também aumentavam as disponibilidades do Tesouro, gerando remunerações. Contrariamente, quando o Bacen tinha prejuízo, o Tesouro o restituía em títulos. Era uma assimetria de tratamento.

Com a Lei n° 13.820/219, essa fonte ficou muito reduzida, porque as variações provenientes das reservas cambiais e das operações com derivativos são destinados à formação de reservas, exceto excepcionalmente, em época de severas restrições de liquidez que afetem o refinanciamento,  com autorização prévia do Conselho Monetário Nacional,  podem esses recursos serem destinados ao pagamento da DPMFi. Só serão transferidos ao Tesouro os recursos com outras origens. Nos dois últimos anos  foi transferido ao TN apenas 5% do que seria transferido pelas regras anteriores.

As reservas cambiais são indispensáveis para a estabilidade da moeda nacional, mas seu valor devia ser menor,  devido a seu alto custo de carregamento. Elas custaram em 2015 R$ 195,8 bilhões e, em 2019, depois da grande queda da Selic, R$ 112,5 bilhões. Não há como suportar um custo desses num país que não consegue fazer superávit primário.

A dívida bruta do governo geral (DBGG), inclui o Bacen, no tocante às operações compromissadas (exclui os títulos livres em sua carteira), mais estados e municípios, passou de 51,5% do PIB em 2013 para 75,8% em 2019. Devido ao covid-19, já estava em 81,9% em maio/2020, deve ultrapassar 100%. As causas desse crescimento estão explicitadas no texto. Nesse total há uma participação de 18% de operações compromissas, cujo grande responsável são as reservas cambiais, na ordem de 20% do PIB. O critério que considera a dívida bruta é igual ao do FMI, só que este inclui os títulos livres na carteira do Bacen, R$ 907,2 bilhões em dezembro de 2019.

A solução para segurar o crescimento da dívida é pagá-la efetivamente, mas para isso necessita gerar superávits primários, manter os juros baixos e reduzir as operações compromissadas, que tem origem principalmente no excesso de reservas cambiais.

Mas com grandes déficits primários estruturais, dificilmente poderão ser mantidos os critérios da Lei 13.820/2019, que estão mais de acordo com a Constituição e propugnam pela responsabilidade fiscal.

Para ler o texto completo em PDF, com tabelas e gráficos, clique Como é paga a dívida federal

Observação: Este texto procura atender a uma solicitação do leitor Vinicius, que não conheço.

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