Reflexões sobre dívida contratual: afirmar que a dívida do Estado já foi paga é uma heresia

Este artigo começa por fazer uma diferença entre dívida em contratos e dívida em títulos, sendo a primeira paga, e a segunda, rolada, em sua quase totalidade. 

A dívida da União é, na sua maioria, em títulos, e como tal, a maioria rolada.  A despesa com a dívida em 2021 correspondeu a cerca de dois trilhões de reais, ou 22,6% do PIB, mas que foi rolada por novas operações de crédito de R$ 1,6 trilhão (19% do PIB)  No final, o dispêndio líquido foi de R$ 313 bilhões, ou 3,6% do PIB, na metodologia acima da linha.

A União não teria como pagar esse valor com receita ordinária, quando sua receita tributária, a principal, é pouco acima de 19% do PIB, inferior à despesa referida.  Apesar disso, entidades sindicais e corporativas afirmam que o valor pago de juros foi os 22,6% do PIB, porque isso serve a seus propósitos.

A dívida em contratos, por seu turno, tem ou deveria ter suas prestações pagas na íntegra.  A dívida do Estado do RS, cujo saldo devedor não decresce, deveria ter decrescido, se tivesse sido cumprido o plano de amortização. No entanto, o acordo de refinanciamento de 1998, em vez estabelecer que o pagamento seria o valor das prestações calculadas, estabeleceu que seria paga 13% da receita líquida real, um proxy da receita corrente líquida, que foi reduzido posteriormente. Além disso, colocou dentro desse limite oito dívidas anteriores mais parte da Operação Proes.  Por tudo isso não caiu o saldo devedor.

Toda dívida por contrato é paga mediante um plano de amortização que, se for cumprido, ou seja, se forem pagas integralmente as prestações, o saldo devedor necessariamente cai. Por isso, afirmar que a dívida já está paga é uma heresia. Se houve pagamentos e a dívida continua a crescer foi porque os desembolsos ocorridos não se destinaram à sua amortização, mas ao pagamento de outras dívidas.  A dívida objeto do contrato foi paga somente parcialmente.

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