Circula nas redes sociais um cálculo equivocado sobre previdência

Circula nas redes sociais um texto que traz os cálculos constantes do texto abaixo, onde afirma que a previdência é um alto negócio para o governo e explica as razões pelas quais isso ocorre.
Inicialmente transcrevo  o aludido texto, para depois apresentar minha visão  sobre o assunto, onde exponho as razões de minha discordância .
I – Texto
Vamos ver se a previdência é realmente deficitária, vejamos:
Salário mensal: 880,00
Contribuição do INSS: 176,00
(patronal e empregado)
Aposentadoria integral:
35 anos = 420 meses
Pagando a contribuição mensal de R$ 176,00 e aplicando-se o rendimento da poupança de 0,68%. Totaliza R$ 422.784,02.
Considerando-se a expectativa de vida em 75, e que em média o brasileiro se aposenta aos 60 anos somente receberá a aposentadoria por 15 anos, porém o montante acumulado é suficiente para pagar o equivalente a contribuição, ou seja, segundo cálculo feito 880,00 mensal em contar rendimentos.
O trabalhador receberá de volta do governo R$ 158.400,00 no total, ou seja, 37,5% daquilo que lhe foi tomado pelo governo, resumindo:
Trabalhador paga R$ 422.784,02
Trabalhador receber R$ 158.400,00
Que negócio, não?
Agora aumentando para 49 anos o trabalhador acumulará R$ 1.365.846,02
E receberá menos, pois terá mais tempo de contribuição e menos gozo da aposentadoria.
Esses cálculos foram feitos pelo cientista político Itamar Portioli de Oliveira, são reais, facilmente constatado em uma planilha, não são dados fictícios.
Quem pode compartilhar para ajudar a chegar  em todo o Brasil.
Vamos à luta! Não vamos deixar isso acontecer, vamos reclamar. COMPARTILHEM.
 
II – MINHA VISÃO
No meu entendimento o cálculo em causa está equivocado por partir de premissas falsas, pelas seguintes razões:
Razão 1
O cálculo ignora uma das premissas básicas em que está assentado o Regime Geral (INSS), que é o sistema de repartição simples, em que os TRABALHADORES DE HOJE pagam a aposentadoria dosTRABALHADORES DE ONTEM, esperando que os TRABALHADORES DE AMANHÃ lhe façam o mesmo.  É a solidariedade entre as gerações.
Nesse sistema não há juros, porque os recursos não são aplicados na poupança, porque são usados para pagar os benefícios em vigor.
Alguém poderia perguntar:  mas porque não migrar para o regime de capitalização?  Porque seria impraticável para o INSS,  por quatro razões:
a)    Ele teria que depositar em favor dos segurados, o equivalente ao que teriam na poupança, se o regime fosse de capitalização desde o início;
b)    Teria que deixar de usar as contribuições recebidas dos segurados, para o pagamento dos aposentados, para aplicar no fundo;
c)    Teria que depositar sua parte no fundo que, segundo a lei, pode chegar até na razão dois por um.
d)    E, ainda, teria que manter os pagamentos dos atuais aposentados, para o que necessitaria buscar outras fontes.
Tudo isso, segundo alguns cálculos, de órgãos respeitados como  o IBGE, FIPE, FGV e Banco Mundial, equivaleria de 200% a 250% do PIB.
E, não havendo juros, como não há, em 35 anos, contribuindo com 20%, forma-se 7 anos de contribuição e tem-se mais de  20 anos pela frente, conforme veremos no item 3.
 
Razão 2
Na realidade,  se aplicarmos R$ 176,00 numa poupança, durante 420 meses, chega-se a um valor semelhante ao que chegou a matéria em causa, assim:
Montante =[(1+i)n -1)  / i ] x 176
Substituindo na fórmula pelos valores correspondentes:
Montante = [(1,0068)420 -1)/ 0,0068) x 176] = 419.928, bem próximo dos R$ 422.784,02 do texto original.
Ocorre, no entanto, que 0,68% é uma taxa nominal.
A taxa de 0,68% ao mês equivale a 8,5% anual. Mas não se pode usar taxa nominal neste caso, mas taxa real, acima da inflação.
Se a inflação ficar em 6,5% (teto da meta), a taxa real no caso em tela é de apenas 1,87% (1,085/1065-1), o que corresponde a uma taxa mensal de  0,15%.
Aplicando essa taxa na fórmula acima temos um montante de: R$ 102.869, menos de ¼ do citado no texto em causa.
Razão 3
A expectativa de vida adotada para a aposentadoria não é a expectativa ao nascer, mas a expectativa de sobrevida no momento da aposentadoria, no caso considerado, aos 60 anos.
Segundo as Tabelas de Mortalidade do IBGE, tabela 3, p.9  em 2015, a expectativa de sobrevida aos 60 anos era de 20,2 anos para o homem e 23,8 anos para a mulher, perfazendo uma média de 22,1 anos.  Ver linck a seguir.
 
Razão 4
Em 22 anos, a remuneração total recebida é o produto de R$ 880,00 x 12 x 22 = R$ 232.320,00. Mesmo que se tome a expectativa de vida do homem,  esta conta chega em R$ 211.200,00, ambas mais que o dobro da poupança formada.
Por tudo isso é que a previdência é deficitária. E não está sendo considerada a pensão por morte. Um homem de 55 anos que case com uma mulher de 20 anos mais moça ele aumenta a expectativa de vida para efeito de recebimento de benefício em mais ou menos 23 anos.  Recentemente foram modificadas as regras das pensões, com reflexo nisso, para melhor.  
 
Razão 5
A quinta razão, que decorre das demais, é a que dá tratamento isonômico entre o montante das contribuições e a dos benefícios. Se as contribuições previdenciárias mensais são  reajustadas por taxas nominais, os benefícios das aposentadorias devem  também receber os reajustes decorrentes da inflação.
Tomemos, então, um taxa anual de 6,5%, o que equivale a 0,53% mensais.  Adotando a mesma fórmula, temos que em 22 anos (264 meses), o valor  dos pagamentos mensais iniciais de R$ 880,00 forma um montante, assim calculado:
Montante = 880,00 x [(1,0053  264  – 1) / 0,0053)] = 504.258,00

 

Portanto, maior que  o montante formado pela contribuições à taxa nominal de 8,5% ou 0,68% ao mês, citado no texto original de R$ 419.928,00

7 comments

  1. ADRIANO K REIS

    Olá Darcy.

    Um feliz 2017. Excelente comentário. Oportunamente farei também minhas argumentações, porém uma das razões me chamou a atenção. Trata-se do homem que se casa com uma mulher 20 anos mais nova. Por exemplo, o Presidente Temer casado com a Marcela. Temer recebe a aposentadoria de procurador pelo estado de São Paulo no valor de R$ 30.000,00. Recebe também o subsídio de Presidente de R$ 23.000,00, aproximadamente. Caso venha a faltar, a Marcela, lembrando que é mais de 20 anos mais nova, ficará com a pensão de R$ 30.000,00? É mais ou menos isso, correto? Por isso que a expectativa de vida sobe, aumentando a necessidade de alterar a idade mínima.

    Na verdade, são uns "mimos" que a política nos apronta, concordas?

    Abraços

    Adriano K. Reis

  2. James

    Tem um detalhe que normalmente passa batido. Gente que se aposentou recentemente(pior ainda os que se aposentaram há 10, 15 anos), pagando INSS na maior parte da fase contributiva baseado em salário mínimo de US$ 100, e com o aumento forçado do salário mínimo até chegar aos US$ 300, passou a receber ainda muito mais dinheiro do que com o que efetivamente contribuíram para receber, o que normalmente já teria acontecido se o SM tivesse se mantido em US$ 100. Ninguém fala nada disso! Você, Darcy, que é do ramo, poderia fazer um estudo do tamanho do rombo que isso representa em termos individuais, de gente que contribuiu para receber X durante Y anos e anda recebendo hoje muito mais que X (quem sabe 2 ou 3x) e por Z (muito maior que Y) anos, por causa desta aberração do salário minimo que passou de 100 para 300 dólares.

  3. ARTUS JAMES LAMPERT DRESSLER

    A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR: "E OS TRINTA PRIMEIROS ANOS DE CONTRIBUIÇÃO SEM NENHUMA APOSENTADORIA NÃO ENTRA NESSE CÁLCULO. FALA SÉRIO.
    ELE FOI USADO PARA CONSTRUIR BRASÍLIA E OUTROS QUE TAIS. ESSE NEGÓCIO DE HOJE UNS TRABALHAM PARA SUSTENTAR OS APOSENTADOS É ALICERÇADO NAS BAZÓFIAS E FALÁCIA QUE ESCONDEM TODA A GRANA QUE SUMIU , JÁ QUE DEPOSITADA NOS TRINTA PRIMEIROS ANOS.

  4. ARTUS JAMES LAMPERT DRESSLER

    CAPÍTULO DOIS
    RESPEITO É NECESSÁRIO E EU DEGUSTO.
    FAZ DE CONTA QUE DESDE O INICIO HAVIA TRABALHADORES E APOSENTADOS O QUE COSUMIRIA TODA A GRANA ARRECADADA NOS TRINTA PRIMEIROS ANO (QUE NÃO EXISTIAM SEM APOSENTADOS), CLARO QUE A TÍTULO DE DEBOCHE.
    VAMOS PARA DEPOIS DOS TRINTA PRIMEIROS ANOS COMO SE O CAIXA DA PREVIDÊNCIA ESTIVESSE ZERADO, para dar “ASAS CURTAS” ÀS FALÁCIAS E BAZÓFIA DO DÉFICIT EXISTENTE.
    APARANDO AS ASAS;
    VAMOS LÁ:
    O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL = INSS – em sendo destinado a se prover das contribuições dos trabalhadores para prover solidariamente as aposentadorias de tantos COM DIREITOS ADQUIRIDOS, como se uma caixa hermética de usuários contribuintes não faltaria grana.
    OCORRE que o governo fez do sistema uma gandaia atirando para dentro “gente” que nada tem com o sistema; como por exemplo, tantos quantos nunca contribuíram lhes atribuindo benefícios sacados do cofre que acabou sem fundos; desde os trabalhadores das zonas rurais.
    PREVIDÊNCIA SOCIAL Não é ASSISTÊNCIA SOCIAL. A PRIMEIRA É UM SISTEMA (PARTICULARIZADO AOS SÓCIOS CONTRIBUINTES).
    A ASSISTÊNCIA SOCIAL deve ser provida com VERBAS do TESOURO DA REPÚBLICA e não safadamente pegar carona oficializada, mas, nem por isso, deixando de clandestina para usufruir das vantagens de ‘CLUBE FECHADO’ que foi assaltado pela bonomia de quem sempre pretende fazer abanicos com os chapéus dos outros: O GOVERNO.
    Já que temos a seletiva TURMA DA OPERAÇÃO LAVA JATO – JUIZ SERGIO MORO/MINISTÉRIO PÚBLICO E POLÍCIA FEDERAL eu desafio o GOVERNO a entregar para os mesmos a realização de uma auditoria; virá a especificação dos nos estupros a que vem sendo submetida a PREVIDÊNCIA SOCIAL à luz do dia; SERÁ MAIS QUE UM “PETROLÃO”, ou um TITANIC

  5. Darcy Francisco Carvalho dos Santos

    vamos por parte, tantos são os questionamentos. Adriano, tens razão, Tanto o Presidente Temer como qualquer um tem esse direito. É o tal de direito torto, porque assim estabelecem as leis, que precisam ser mudadas.
    Quanto ao valor real do salário mínimo, tem razão o James, e isso é uma das causas do rombo no Regime Geral. Mas é outro problema legal. Se ninguém pode ganhar menos que o salário mínimo e o salário mínimo apresenta crescimento reais desde 1994, não há como evitar esse reflexo, a menos que se desvincule a previdência do salário mínimo. Mas isso é quase impossível politicamente.
    Quanto à construção de Brasília e outros desvios do dinheiro da previdência, isso não influi mais hoje, porque se trata de repartição simples. O que podemos criticar foi o fim do regime de capitalização adotado inicialmente.

  6. Flávio "Pestana"

    A conta parece estar correta. Porém, toma em consideração apenas uma fonte de receita: as contribuições dos trabalhadores. Mas, e a CSLL? E a receita líquida de concursos de prognósticos (loterias e afins)? A primeira, por exemplo, é repassada ao consumidor, o que inclui aposentados e pensionistas.

    Outro ponto, além das fontes de custeio que citei acima, é que o sistema de seguridade social é composto por saúde/assistência/previdência, e um dos argumentos daqueles desfavoráveis à reforma, é que está sendo isolada a previdência no que se refere a receita. Então, a seguridade social é superavitária e a previdência não? (Para isto, só consultar documentos anuais da AFPI).

    Outro ponto pouco comentado é a DRU, que, por sinal, aumentou há pouco tempo. Muito conveniente tirar dinheiro da seguridade social para dar margem de manobra ao governo. Principalmente quando o governo está anistiando débitos tributários de planos de saúde, grandes grupos de imprensa e clubes de futebol (que, aliás, ainda ganham loteria para se salvar…).

    A questão, a meu ver, não se resume a um mero cálculo. E tal questão deveria ser bem mais discutida do que apenas se tem feito: apresentando um lado como verdade absoluta.

    Parabenizo por elucidar a questão do cálculo.

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