PAC: grandes investimentos ou “marketing”?

O denominado Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), quando lançado em 2007, previa investimentos de R$ 503,9 bilhões, no período 2007-2010, dos quais apenas R$ 67,8 milhões, ou 13,5% seriam oriundos do Orçamento da União. O restante, na ordem de R$ 436,1 bilhões seria aplicado por estatais, empresas privadas e outros entes governamentais.

Nos investimentos do PAC estão incluídas também as obras ou aquisições patrimoniais financiados por organismos federais, onde existe a obrigação de devolução futura dos valores recebidos pelos tomadores dos empréstimos, acrescidos de juros.
Quando se observa os investimentos realizados pelo Governo Federal, com recursos do orçamento geral, constata-se que eles são reduzidos e declinantes, não atingido 1% do PIB, em média, se considerarmos o período 1991-2009.

No entanto, dimensionar exatamente o montante dos investimentos feitos pelo Governo Federal não é uma tarefa fácil, por dois motivos: O primeiro deles é que uma parte é feita com recursos transferidos aos entes subnacionais, que registram em suas contabilidades como investimentos seus, gerando dupla contagem. Excluindo essas transferências, o valor dos investimentos diretos do Governo Central ficou em torno de 0,4% a 0,5% do PIB, entre 1995 e 2009.

O outro motivo que dificulta a apuração do montante de investimentos é a grande quantidade realizada em restos a pagar, já que as dotações próprias do exercício apresentam baixo grau de realização. Por exemplo, entre 2007 e 2009, em pleno período de vigência do PAC, a despesa liquidada foi de apenas 23,7% da dotação, em média. Como se sabe, despesa liquidada é despesa em condições de ser paga, sem que seja necessariamente paga.

Por outro lado, no mesmo período, 55,4% da dotação, em média, foi registrada em restos a pagar não processados, situação em que os empenhos podem ser anulados, porque ainda não houve a prestação do serviço ou a entrega do material correspondente (Tabela 1).


Tudo isso está a indicar deficiências de planejamento, pela ocorrência de dotações orçamentárias que não são realizadas e a execução de um orçamento paralelo constituído de restos a pagar.

O economista Sérgio Gobetti, do IPEA, em excelente trabalho, denominado “Qual é a taxa de investimento público no Brasil?”, conseguiu apurar a taxa de investimentos de toda a administração pública brasileira, quando desconsiderou as despesas simplesmente empenhadas e que não foram realizadas, da mesma forma que incluiu as realizações de cada exercício, não importando o ano do empenho da despesa. Para evitar a dupla contagem, descontou dos investimentos da União as transferências feitas para esse fim aos entes subnacionais, em cujas contabilidades elas foram incluídas.

Com isso, foi possível calcular a taxa de investimentos nos dois períodos governamentais de FHC e nos dois de Lula, onde se oberva que o primeiro período de FHC é praticamente igual ao segundo de Lula ( 2,14% para 2,20%) e o segundo de FHC é semelhante ao primeiro de Lula (1,85% para 1,70%). A Figura 1 demonstra de forma clara essa afirmativa.

O mesmo comportamento se verifica quando são incluídas as estatais federais, cujas taxas do primeiro período de FHC foi semelhante ao último de Lula ( 3,62% para 3,68%). Já o segundo período de FHC foi exatamente igual ao primeiro de Lula (ambos com a taxa de 2,73%). Tudo o que foi afirmado pode ser constatado na Figura 2, a seguir.

Diante disso, o que se conclui é que os investimentos feitos pelo PAC, em proporção do PIB, são os mesmos que sempre existiram, uma proporção reduzida do PIB, só que agora com muito mais divulgação, ou melhor, com muito “marketing”.
Outro aspecto a destacar é que mesmo a taxa de formação bruta de capital fixo de toda a economia não cresceu após a edição do PAC, pois era de 16,4% do PIB em 2002, chegando em 18,67% em 2008 e descendo novamente para 16,73% em 2009.
Uma pessoa menos avisada poderia pensar que esse nível reduzido de investimentos do Governo é o que permitiu amortizar uma parcela grande da dívida por meio de alto superávit primário, o que não ocorre.

Pela Tabela 2, vê-se que o superávit primário formado deu tão somente para pagar 27,4% dos juros gerados no exercício. O ano de 2009 foi de crise, mas a média do superávit primário de 1997 para cá não chega a 50% dos juros.

Com isso, tem-se o crescimento da dívida, que está sendo provocado também por outros fatores, como o lançamento de títulos da dívida pública para repassar recursos ao BNDES, e para financiar as reservas cambiais, as denominadas operações compromissadas. Com isso, a dívida bruta do Governo Federal passou de R$ 1,740 trilhão em dezembro de 2008 para R$ 2,014 trilhões em fevereiro de 2010, ou seja, mais 274 bilhões ou 15,75% em 14 meses, apenas.

Aliás, sobre o esse assunto, o Prof. Márcio G. P. Garcia, em excelente artigo publicado no Valor Econômico de 16 do corrente, sob o título Mais Transparência, informa que foram repassados pelo Tesouro ao BNDES R$ 100 bilhões, com autorização para mais R$ 80 bilhões, a juros subsidiados, para que o banco aplique em financiamentos, tendo entre os principais beneficiados a Petrobras. O mais grave, no entanto, é ausência da transparência dessas operações no tocante às contas públicas, que são feitas tendentes a aumentar artificialmente o superávit primário, num jogo entre dividendos recebidos que são nele incluídos e juros pagos que não o são.

Além de tudo isso, os gastos do Governo Central passaram de 13,7% em 1991 para 22,3% do PIB em 2009. Somente no período 2003-2009 o crescimento acima do PIB foi de 2,8 pontos percentuais, numa época de grande crescimento do produto, cuja média foi de 4,4% ao ano.

Resumindo, a União fica com uma percentagem em torno de 58% da carga tributária nacional e mesmo assim consegue investir em torno de 1% do PIB somente e pagar menos da metade dos juros da dívida (27% em 2009), cujo montante em 2009 foi de R$ 148 bilhões.

Os juros, apesar de altos, eles são consequência e só podem ser reduzidos com o aumento do superávit primário, que está intimamente ligado à redução dos gastos primários correntes que, como vimos, crescem sem cessar.

A economia está crescendo, mas não deve manter esse ritmo por muito tempo, devido à reduzida taxa de investimentos, para o que o governo, em seus três níveis, contribui com muito pouco. Quando isso ocorrer (tomara que não ocorra) nosso destino será uma inevitável crise fiscal, porque grande parte da despesa é inelástica, isso é, não reduz seu ritmo de crescimento, quando isso ocorre com a receita.

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